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A incidência do ITCMD na previdência privada

ITCMD previdência privada - José Rubens Costa Consultoria Jurídica e Advocacia

No ano de 2019, foi aprovada a Reforma da Previdência (Emenda Constitucional n° 103/2019), que trouxe significativas alterações ao regime da previdência social, influenciando diretamente nos benefícios previdenciários, tal como a aposentadoria.

Nesse contexto, cada vez mais se buscam meios alternativos à previdência obrigatória aos trabalhadores (pelo INSS), a fim de garantir maior conforto e segurança para um momento posterior ou até mesmo para algum evento imprevisível (acidentes, doenças, morte etc.).

Dentre esses mecanismos alternativos, está a chamada previdência privada, que se mostra como uma opção viável e rentável aos seus contratantes, além de afastar as diversas regras da previdência geral, que, com as diversas alterações, podem prejudicar o contribuinte.

Além de um meio alternativo, a contratação de uma previdência privada pode atender as expectativas de quem deseja uma complementação de renda futura.

Outro aspecto de extrema relevância e que pode trazer dúvidas a quem deseja contratar um destes planos é em relação à sua tributação. Afinal, há incidência do ITCMD na previdência privada?

No artigo de hoje falaremos um pouco a respeito da previdência privada e seus planos mais comuns, bem como de suas respectivas tributações.

Ainda, trataremos da utilização da previdência privada como um mecanismo de planejamento sucessório e familiar.

 

O que é o ITCMD?

Antes de adentrarmos especificamente na temática da previdência privada, é importante explicar, inicialmente, o importante tributo que está diretamente relacionado a esses planos.

O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis ou Doação – ITCMD, ou, em alguns estados a sigla é apenas “ITCD” ou “ITD”, é o imposto incidente sobre as transferências de bens, sejam móveis ou imóveis, ocasionados pela sucessão ou doação.

Portanto, o ITCMD possui em seu conteúdo dois fatos geradores distintos: 

  • a transferência de bens em sucessão; e
  • a transferência de bens em doação.

Trata-se de um imposto de competência estadual, nos termos do art. 155, I, da Constituição.

Assim, cada estado instituirá as regras, sujeito passivo e forma de cobrança do imposto. A alíquota também pode variar de estado para estado. No estado de Minas Gerais, a alíquota é de 5% (cinco por cento) sobre a base de cálculo dos bens a serem transferidos. Já no Rio de Janeiro, a título exemplificativo, a alíquota parte de 4% (quatro por cento) e chega a 8% (oito por cento).

Entenda como fica o ITCMD na reforma tributária e os impactos no planejamento sucessório em nosso artigo dedicado ao tema.

Feitas tais considerações acerca do ITCMD, vejamos a seguir se ele incidirá ou não sobre os planos de previdência privada.

 

O que é previdência privada?

Como o próprio nome sugere, a previdência privada é uma espécie de pensão ou aposentadoria que não possui vínculo com o governo.

Sua contratação é particular e funciona como uma complementação da renda de aposentadoria originariamente paga pela Previdência Social, por meio do INSS (Instituto Nacional da Seguridade Social) ou pelas previdências de regimes próprios de servidores públicos

Basicamente, é uma forma de investimento que garantirá ao contratante uma renda passiva futura, o que pode ser muito interessante considerando o teto de aposentadoria pelo regime geral da previdência, que atualmente é de R$ 7.507,49 (sete mil, quinhentos e sete reais e quarenta e nove centavos).

Apesar de não ser um fundo público, a previdência privada está regulamentada pela Lei Complementar 109/2021 e submetida à fiscalização da SUSEP (Superintendência de Seguros Privados).

Segundo o art. 1º da referida lei, o regime de previdência privada possui caráter complementar, facultativo e é autônomo ao regime geral de previdência social. Trata-se de uma constituição de reservas que garantem um benefício futuro.

A previdência privada pode ser dividida nas modalidades aberta ou fechada.

Trataremos a seguir dos planos mais comumente utilizados na previdência aberta no mercado: o Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) e o Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL).

 

Planos de previdência privada aberta: PGBL e VGBL

Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL)

O PGBL é classificado como um plano de previdência complementar e se difere da outra modalidade (VGBL), sobretudo quanto à sua tributação.

Isso porque, os aportes feitos mensalmente ao plano podem ser deduzidos da base do Imposto de Renda em até 12% da renda bruta tributável, para aqueles que fizerem a declaração completa. Portanto, o benefício não se aplica à modalidade simplificada de declaração.

Desse modo, o valor acaba por ser isento de tributação pelo Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF),  o que permite o emprego da quantia em outros investimentos, aumentando o patrimônio do contratante.

 

Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL)

Já o VGBL é considerado um seguro de pessoa, o que implica dizer que sua contratação garantirá ao segurado ou aos seus beneficiários o pagamento de uma indenização ao final da aplicação.

Nesse plano não há o benefício fiscal previsto para o PGBL. Contudo, a incidência do IRPF somente ocorre ao final do investimento, aplicando-se sobre os rendimentos.

Além disso, o valor investido poderá ultrapassar 12% (doze por cento) da renda anual, o que não é possível para o PGBL.

 

Tabela de tributação

Também na hora de escolher um dos dois planos, deve-se considerar qual a tabela de tributação será aplicada: regressiva ou progressiva:

  • A tributação progressiva incide tal como nos salários – quanto maior a renda, maior a tributação.
  • A tributação regressiva diz respeito ao período de investimento – quanto maior o tempo que se investe, menor será a tributação. Assim, para as aplicações com mais de 10 (dez) anos, a tabela regressiva é a mais indicada.

 

Incidência do ITCMD

O ponto mais controvertido sobre a tributação dos planos, no entanto, diz respeito à incidência do ITCMD na previdência privada.

Isso ocorre porque os seguros de vida não são considerados por lei como herança e, assim, dispensam o seu arrolamento em inventário. Assim, muitos entendem que, da mesma forma, tais planos não devem ser incluídos no inventário e, portanto, submetidos à incidência do ITCMD.

Vamos ao que diz a respectiva legislação. Especificamente sobre o VGBL, o Código Civil prevê expressamente que não é tido como herança:

Art. 794. No seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito.

Já o PGBL, está excluído do inventário pela previsão contida na Lei 11.196/2005:

Art. 79. No caso de morte do participante ou segurado dos planos e seguros de que trata o art. 76 desta Lei, os seus beneficiários poderão optar pelo resgate das quotas ou pelo recebimento de benefício de caráter continuado previsto em contrato, independentemente da abertura de inventário ou procedimento semelhante. 

(…)

Art. 76. As entidades abertas de previdência complementar e as sociedades seguradoras poderão, a partir de 1º de janeiro de 2006, constituir fundos de investimento, com patrimônio segregado, vinculados exclusivamente a planos de previdência complementar ou a seguros de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência, estruturados na modalidade de contribuição variável, por elas comercializados e administrados. 

Mas, como o direito se constrói a partir da interpretação e aplicação das leis, também é necessário analisar como os tribunais vêm decidindo sobre a incidência do ITCMD na previdência privada.  

 

Sobre VGBL

Por ter natureza de seguro de vida, assim como reconhece a SUSEP, o VGBL não poderia ser incluído em herança. Nesse sentido está a jurisprudência e doutrina majoritárias, sendo, inclusive, o entendimento adotado pelo STJ:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ITCMD. INCIDÊNCIA NO PLANO DE PREVIDÊNCIA VGBL. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO ART. 794 DO CÓDIGO CIVIL. NATUREZA DE SEGURO DO VGBL. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE HERANÇA. ENTENDIMENTO PACIFICADO PELA SEGUNDA TURMA.

1.Trata-se de Mandado de Segurança impetrado com o escopo de afastar a inclusão dos valores referentes a plano de previdência VGBL na declaração do Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD. No primeiro grau, a demanda foi julgada procedente.

O Tribunal de origem manteve a decisão.

2. A matéria foi pacificada pela Segunda Turma do STJ, no julgamento do REsp 1.961.488/RS, Rel. Ministra Assusete Magalhães, DJe de 17.11.2021. Decidiu-se que não integrando a herança, isto é, não se tratando de transmissão causa mortis, está o VGBL excluído da base de cálculo do ITCMD, uma vez que possui natureza de seguro.

3. Assim, os valores a serem recebidos pelo beneficiário, em decorrência da morte do segurado contratante de plano VGBL, não se consideram herança, para todos os efeitos de direito, como prevê o art. 794 do CC/2002.

4. Agravo Interno parcialmente provido para conhecer do Recurso Especial para negar-lhe provimento. (AgInt no AgInt no AREsp n. 1.755.009/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 16/5/2023, DJe de 28/6/2023.)

Contudo, o mesmo não se aplica de forma tão uniforme ao PGBL.

 

Sobre PGBL

Apesar da previsão na Lei 11.196/2005, há um dissenso jurisprudencial e doutrinário acerca da incidência do ITCMD sobre o PGBL.

Enquanto parte da doutrina entende que o imposto é devido, por se tratar de um plano cuja natureza jurídica se confunde com uma aplicação financeira de longo prazo e integrante da herança, outra parte da doutrina entende que o PGBL é um contrato de execução continuada, que após a morte do segurado nasce a obrigação de crédito da seguradora para com os beneficiários.

Em Minas Gerais, Paraná e Rio de Janeiro, encontram-se decisões favoráveis aos contribuintes, afastando a incidência do ITCMD sobre o PGBL.

Já em São Paulo, em que pese o posicionamento do Fisco Estadual no sentido de não incidência do ITCMD nos planos de previdência complementar, o Judiciário tende a analisar os casos concretos para decidir se incidirá o imposto sobre o PGBL.

O principal fundamento para decidir se o imposto será ou não devido é se a contratação do plano se deu como fonte de renda para auxílio na subsistência do titular ou beneficiário ou se a contratação se deu para a complementação da renda.

No primeiro caso, o plano possuirá caráter previdenciário e afastará a incidência do ITCMD. No outro, caracterizada a natureza de aplicação financeira e investimento, atrairá a incidência do ITCMD.

O assunto ainda não foi discutido pelo STF, porém o Recurso Extraordinário 1.363.013 (Tema de repercussão geral 1.214) discute a incidência ou não do ITCMD no PGBL e VGBL.

De certo, a pacificação do tema permitirá a contratação desses planos de previdência privada de forma mais segura.

 

Previdência privada e o planejamento sucessório

Seja pelos benefícios fiscais para fins de IRPF ou pela possibilidade de não incidência do ITCMD quando da morte do segurado, os planos de PGBL e VGBL são ótimas escolhas para quem deseja se preparar para o futuro e também realizar um planejamento sucessório.

Além da previdência privada, existem outros mecanismos que podem tornar a sucessão do patrimônio menos onerosa e, muitas das vezes, a mescla entre esses modelos é o ideal.

Aqui você pode ler mais a respeito do planejamento sucessório!

 

Conclusão

Os planos de previdência privada contribuem para que possamos nos proteger e nos programar para um futuro mais tranquilo para nós e nossos entes queridos.

Assim, conhecer as suas modalidades e as especificidades de cada uma delas antes de realizar o investimento é essencial.

Esperamos que você tenha aprendido um pouco mais sobre essas duas possibilidades, PGBL e VGBL, e a sua tributação. Apesar de a incidência ou isenção do ITCMD na previdência privada não estar pacificada, é possível traçar estratégias que combinem outras ferramentas, garantindo economia tributária e um investimento mais eficiente da renda. E se você quer saber mais sobre como a reforma tributária de 2024 impactou o ITCMD, não deixe de ler nosso artigo sobre o tema!

Caso permaneça alguma dúvida, entre em contato, nossa equipe estará apta a te auxiliar!

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2 comentários em “A incidência do ITCMD na previdência privada”

  1. Sou contador, mas pesquisei e não encontrei uma resposta para a minha duvida, casados por comunhão universal de bens, 70 anos, marido estado terminal, faz PVBL, em nome da esposa, valor 6 milhoes de reais, não paga ITCD? não entra na partilha? mas o patrimonio é um só, se fosse em nome dos filhos ok.
    poderia alguem fazer um comentário para mim? É isto mesmo?
    obrigado
    ROBERTO

    1. Olá, Roberto!
      Agradeço pelo seu comentário e pela confiança em nosso blog.

      Há diferentes entendimentos sobre a incidência do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) em situações como a que você descreveu. Especificamente em Minas Gerais, o ITCMD seria retido na fonte e o PGBL não entraria na partilha de bens, seria direcionada ao beneficiário indicado pelo participante.

      No entanto, para oferecer uma resposta mais precisa e adequada à sua situação, sugiro que entre em contato conosco pelo telefone/WhatsApp (31) 97264-6960 para agendarmos uma consulta.

      Dessa forma, poderemos analisar todos os detalhes do seu caso e fornecer a orientação jurídica necessária

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